Cor de raiva
Por Pinguim Urbano
Amar para quê?
Amar é um elo
entre o azul
e o amarelo.
Fico verde de raiva
quando penso nisso.
~Paulo Leminski
“Amar é um elo
entre o azul
e o amarelo.”
Leminski começa brincando de roda com as palavras — mas o tapa vem logo depois. Usando três cores e cinco versos, ele traça um poema que parece leve à primeira vista. Parece. Porque por trás da ironia, tem frustração pura disfarçada de esperteza.
O tal “elo entre o azul e o amarelo” é o verde. Mas o que deveria ser harmonia vira desconforto. Porque o verde aqui não é esperança. É raiva. O sentimento que sobra quando o amor não vale o que custa.
“Fico verde de raiva / quando penso nisso.”
A conclusão do poema quebra o romantismo da imagem anterior. Ele desmonta a metáfora como quem pisa no próprio presente dado. Não tem mais paciência. Não tem mais flor. Só sobra o sarcasmo. E isso é muito Leminski.
Esse poema é o tipo de bilhete que alguém deixaria grudado na porta da geladeira depois de ir embora. Curto, seco e afiado. Amor, aqui, é causa de irritação estética. E o poeta resolve isso da única forma possível: com uma pequena vingança verbal.
Porque às vezes, pra não desabar, a gente escreve — só pra fazer questão de que não foi em vão.
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