Sonhar cansa. E tem gente que cobra menos por isso.
Por Pinguim Urbano
Me alugo para sonhar.
Como não tenho mais nada, nem ninguém,
alugo-me.
Alugo meus olhos, para quem quiser ver com os olhos de dentro.
Alugo meus braços, para quem não tem abraços.
Alugo minhas pernas, para quem tem caminhos demais.
Alugo minhas noites, para quem só dorme de dia.
Me alugo barato, me alugo de graça.
Me alugo para sonhar.
“Me alugo para sonhar.
Como não tenho mais nada, nem ninguém, alugo-me.”
O poema já começa no fim. Quem diz isso não sonha mais por escolha — sonha porque é a única moeda que sobrou. Sonhar virou ofício, quase esmola. Quando a vida vira aluguel, até o que era sagrado vira prestação.
“Alugo meus olhos, para quem quiser ver com os olhos de dentro.” A poesia aqui não é sobre esperança. É sobre cansaço. É sobre o sujeito que já cansou de olhar pra fora, e agora empresta o que sobrou de si. Um tipo de empatia exausta. Um contrato emocional sem cláusulas.
“Me alugo barato, me alugo de graça.”
O desespero tem seu preço. E às vezes, o preço é nenhum. Tem gente que entrega tudo sem nunca ser pago. Gente que sonha pelos outros, sente pelos outros, segura a barra que nem é sua — só pra continuar tendo alguma utilidade no mundo.
E no fim, “Me alugo para sonhar” não é só uma frase bonita. É o retrato de quem vive no limite da sensibilidade. Quem já não sonha por si mesmo, mas ainda assim não consegue parar de projetar esperanças que não são suas. Uma espécie de freelancer do afeto.
A grande verdade é essa: tem gente que sente demais e acaba vivendo por tabela. Gente que vira abrigo dos outros e esquece de si. Esse poema é sobre eles. Ou sobre todos nós, em alguma fase silenciosa da vida.
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